O "Café do Geléia", fundado por Giovanni Di PaZZo, começou como um pequeno café na esquina da rua Orlontis com a rua Coronel Verde. Servindo apenas poucas variações do simples café o lugar foi ganhando fama devido ao seu ambiente altamente aconchegante contendo fotos de viagens feitas pelo "Geléia" (apelido carinhoso de Giovanni), relíquias e artefatos adquiridos em suas diversas aventuras pelo mundo em busca do melhor café que existia. Certo ano, Giovanni conseguiu por métodos misteriosos o melhor café que os que ali passavam já haviam provado e começou a plantá-lo e serví-lo em seu pouco famoso "Café do Geléia". O lugar ganhou fama pelo seu café fabuloso e pelo ambiente que sugeria um conto de histórias entre amigos. Agora vivemos estas histórias... Bem vindos ao "Café do Geléia".

terça-feira, 28 de maio de 2013

Viagens


               O Artista e o Viajante estavam em uma mesa no Café compartilhando estórias. Fazia tempo que isso não acontecia pois o viajante estava levando sua Bagagem Emocional para lá e para cá em busca de algo que nem ele conhecia. A lareira estava acesa e os dois pegaram uma mesa próxima para se esquecer do frio que fazia lá fora.
                  As cadeiras que escolheram estavam perfeitas. O acolchoado havia se moldado aos traseiros de seus respectivos usuários que agora estavam confortavelmente relaxados com pernas cruzadas e apreciando um bom chocolate quente. O Artista, quase sempre melancólico de um tempos para cá, falava sobre relacionamentos que não davam certo, de duvidas que ficavam em seu subconsciente e falava também das oportunidades perdidas quando tratando do enigmático sexo feminino.
                  As vozes dos outros clientes ao fundo criava uma certa barreira de segurança para os dois que sentiam que podiam falar em bom som sem que ninguém se irritasse, ouvisse de canto ou interrompesse. O Viajante falava dos lugares que visitou e das coisas que viu, mas sem muita presunção. Ele falava da busca eterna de sua alma por algo para preencher o vazio que ele sentia muitas vezes. Foi em meio a desventuras que os dois viram Helen chegando ao café com malas e toda agasalhada.
                  - Ela deve estar voltando de alguma viagem também... – Disse o Viajante enquanto molhava a garganta com um pouco de chocolate quente.
                  - E quando ela não está? – Sorriu o Artista enterrando-se mais em seu assento e acomodando os braços nos apoios.
                  Helen ficou um tempo no balcão e, depois de pedir uma taça de vinho, foi para junto de seus amigos perto da lareira. Ele veio cheia de sorrisos e com um bronzeado que não estava lá antes.
                  - Boa noite, meninos!
                  Eles responderam com sorrisos e depois de trocados os clássicos “Como vão vocês?”, “Bem obrigado! E Você?”, ela logo começou a falar.
                  - Gente! Eu acabei de voltar da Rússia! – Ela se acomodou na cadeira que escolhera.
                  - Puxa vida. Parece interessante. – Dizia o Viajante. Por mais que não estivesse com tanto interesse assim, ele conseguia ser carismático a ponto de ouvir o que as pessoas tinham a dizer. Já o Artista fechou um pouco sua expressão.
                  - É lindo! Os palácios, o frio, as roupas, as pessoas! Nossa, vocês tem que ir pra lá!
                  O Viajante dava alguns sorrisos para ela e tentava ser o mais amigável possível enquanto ela falava e falava sobre tudo que tinha visto e de como o lugar era muito melhor do que aqui e toda aquela groselha que todos falam depois de terem viajado para muito longe, tendo visto paisagens exóticas. E como sempre, a moça terminou com a famosa frase:
                  - Vocês precisam ir pra lá!
                  O Artista suspirou.
                  - Desculpe, Helen, mas não... eu não preciso ir para lá.
                  Ela virou os olhos sabendo que lá vinha mais uma crítica.
                  - Por que sempre que as pessoas viajam para longe ela ficam falando com os outros com um ar de “Nossa, vocês está perdendo sua vida aqui” ou senão “Ai, vocês precisa viajar pelo mundo para aproveitar!”. – Ele estava, na verdade, falando com quem quisesse ouvir, por isso Helen apenas se recostou e ficou bebendo seu café.
                  Ele continuou:
                  - Viajar é chato! Custa caro demais simplesmente para ver paisagens que ficam bonitas em fotografias. Viajar gasta dinheiro, consome tempo, da dores de cabeça e tudo para te levar para um lugar que tem a mesma coisa que tem aqui e estraga tudo no mundo inteiro.
                  - Pessoas? – Helen arriscou, sorrindo para Geléia que passava lá perto e ria silenciosamente das balburdias do amigo artista.
                 
                  O Artista continuou reclamando por um tempo e, quando finalmente parou, Helen retrucou:
                  - Mas se você acha que as pessoas falam com esse tom de “Você está desperdiçando sua vida”, então é por que, no fundo, você pensa assim.
                  Com um ultimo gole de café, ela saiu com todo seu rebolado e voltou ao balcão para conversar com o Geléia. O Viajante olhou quieto para seu próprio chocolate quente e o Artista sussurrou para si mesmo:
                  - Quer saber? Nem falo mais disso com você.


"Viajar é chato! [...]"