O "Café do Geléia", fundado por Giovanni Di PaZZo, começou como um pequeno café na esquina da rua Orlontis com a rua Coronel Verde. Servindo apenas poucas variações do simples café o lugar foi ganhando fama devido ao seu ambiente altamente aconchegante contendo fotos de viagens feitas pelo "Geléia" (apelido carinhoso de Giovanni), relíquias e artefatos adquiridos em suas diversas aventuras pelo mundo em busca do melhor café que existia. Certo ano, Giovanni conseguiu por métodos misteriosos o melhor café que os que ali passavam já haviam provado e começou a plantá-lo e serví-lo em seu pouco famoso "Café do Geléia". O lugar ganhou fama pelo seu café fabuloso e pelo ambiente que sugeria um conto de histórias entre amigos. Agora vivemos estas histórias... Bem vindos ao "Café do Geléia".

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

A Cova


            Tive um sonho. Não foi esses dias ou a pouquinho tempo. Tive o mesmo sonho de novo, um sonho recorrente que, por mais que seja sonho me atormenta na vida real e esmaga minha alma como uma prensa... Uma prensa que aos poucos uma entidade ou sentimento desconhecido vai apertando e apertando.
            Eu estou andando. Geralmente meus sonhos começam assim. Eu ando ou corro, geralmente de algo ou alguém e isso é terrível. Eu estou me vendo. Sonhos em terceira pessoa são meus favoritos pois não passam de filme sobre você. Você vê toda a ação e sente ela na pele, mas inconscientemente (por que é do inconsciente que tudo se trata) você sabe que é só um sonho e nada daquilo realmente está acontecendo. Estou andando em um grande campo gramado. A grama é verde e com orvalhos... Parece que tem chovido, pois também estou usando um sobretudo ao melhor estilo detetive e conforme vou andando percebo que meus sapatos estão ficando molhados por causa de um orvalho ou outro colhido aqui e ali. Minha respiração é calma e o caminhar também. Não parece que estou com pressa.
            Depois de andar por um tempo nesse campo gramado debaixo de um céu nublado e quase prateado, eu começo a perceber que uma neblina está aparecendo e ficando cada vez mais densa. Não se tem muito para enxergar, mas continuo minha caminhada como se nada estivesse acontecendo, apenas fecho melhor o sobretudo e continuo andando. Depois de alguns passos longos, começo a olhar para os lados. Não com cara de perdido nem apreensivo, mas um olhar quase que determinado, como se procurasse alguém com quem marquei de me encontrar e conforme vou caminhando e olhando para os lados, começam a aparecer lápides, tumbas e mausoléus no caminho. Claramente estou em um cemitério e caminho sob o olhar protetor de anjos e divindades e acima de lágrimas de tristeza.
            O gramado vez ou outra cede espaço para uma pedra aqui e outra acolá, como se o cascalho já tivesse sido tomado pela grama negligenciada. Eu continuo procurando e dessa vez olho as lápides com maior cuidado, lendo seu conteúdo. Cruzo caminhos com famílias diversas e vejo o rosto de muitas pessoas desconhecidas, mas continuo procurando na estrada de lágrimas antigas e novas até que parece que acho o que estava procurando. Vejo uma lápide um pouco mais solitária em meio as outras. Uma lápide em forma de cruz e um pouco mais trabalhada, mas ainda assim rachada e com musgo. A sua frente, vejo uma cova aberta e lá dentro um caixão fechado e muito bonito. Tudo está confuso enquanto assisto a mim mesmo durante tal empreitada, é apenas um sonho e seu sentido é abstrato, mas meu coração acelera consideravelmente ao ver o nome na lápide.
            O meu nome.
            E eu assisto a mim mesmo lamentando sobre meu corpo, morto a sabe-se lá quanto tempo. Também vejo meu eu vivo como se conversasse com meu eu morto e seu tom é de escárnio, as vezes ódio e de vez em quando tristeza. Mas ele discorre sobre que rumo tomamos. Por que tomou as decisões que tomou? Qual foi o sentido de sua vida no fim das contas? O que você fez de significante? Por que ninguém importante para nós apareceu lá? Ele faz as perguntas e as vezes ele mesmo tem a resposta, mas mesmo assim não as entende como tal. No fim das contas ele fica quieto e sonda a minha cova. Nossa cova. Ele cospe nela e olha para mim, o espectador solitário e silencioso desse tempo todo, e lança a pergunta:
            - O que diabos você tem feito? - Seu olhar é penetrante e repreensor.
            Fico com medo por não saber a resposta.

"Vejo uma lápide um pouco mais solitária em meio as outras."